Poesia (ou monólogo)
Chegue, pegue uma cadeira, divida a mesa comigo. Pode sentar, eu deixo você sentar. Quer olhar meus anéis e pulseiras? O colar veio de Amsterdã. É sim, meu primo trouxe para mim. O brinco? Comprei ano passado. Bonito? Suas pulseiras também. Pode beber do meu copo. Reparta seu sonhar comigo. Vinho é bem gostoso mesmo, gosto de bebidas doces. Pode, sim, chegar mais perto. Gosto muito dessa música que você tá cantando. Nostálgica? É... talvez por isso eu goste. Não sei. É de quem mesmo? Sou péssima de memória. Amanhã? Não vou fazer nada à noite. Ler um pouco à tarde. Claro, a gente pode ir olhar flores no parque. Pode pedir algo para comer, a gente divide o prato. Se quiser, vamos comer comida chinesa. Macarrão frito? Ótimo. Vá ao banheiro, eu espero. Sente-se desse lado da mesa. Não, esse anel não quer dizer mais nada. Ele disse algum dia. Não faz mais sentido. Minhas mãos estão bem frias. As suas também. É esse clima de Brasília. Pode encostar seu ombro no meu. A gente deve ser quase da mesma altura. Vamos pedir a conta? Podíamos ir ver as luzes da Esplanada. Claro, claro. As palmeiras de lá são as únicas que me agradam. Adoro poesia. Mas não entendo de flores. Só de barrigudas. Elas ficam floridas duas vezes no ano... mas uma dessas vezes não são flores de verdade... Quando ficam brancas (e mais bonitas), não estão dando flores, mas é como se fossem. Não, não tenho medo de escuro. Tenho medo de morrer doente. O que acho do amor? Proporciona os melhores suspiros. E você? Ah, sim, sempre vale a pena deixar-se levar. Não, não estou bêbada... duas taças de nosso vinho não me deixaram bêbada. Passo a noite contigo. É boa companhia. Cinema italiano? Prefiro francês. Pornográfico, mas dramático. Italiano é leve demais. Gosto da leveza, mas o drama me satisfaz. A gente passa no supermercado, compra um cd de samba qualquer. Dicró? Só se for a música da mulher que quebra vidraça de delegacia. A gente samba, samba sim. Samba raro e clássico. Jorge Ben? Quando os alquismistas vão chegar? Eles estão chegando... mas eu não sou muito mítica. Se já tirei tarô? No bar uma mulher tirou para mim... Foi quase como um samba malandro. Deixar-se ir com a realidade nua e crua. Não, não acreditei. Pára de rir, eu paguei bem pouco. Ela só me disse o que eu já sabia, oras! Chegue... pegue em meu cabelo. É liso assim mesmo. Pele boa? Não, bem seca. Eu acho. A sua também é boa. Gostoso tocar seu rosto. Pára o carro! Olha só, aquela flor. Coloca na carteira, para não dizer que nunca te dei nada! São os presentes mais bonitos, os mais simbólicos. Guardará para sempre? Eu também. Tenho péssima memória só para o que não importa. Flores importam. Nossa, que jardim bonito. O meu não é tão bem cuidado. Não sei muito bem lidar com ele, ainda. Que rosa linda. Parece comigo? Que gentileza. Parece melodia. Sente meu coração? É batuque mesmo. Sinto o seu sim, ele bate no mesmo ritmo em que você balança seu pé. Nunca tinha reparado? Não tinha ninguém para ouvir direito o toque dele. Estou com frio, pode trazer outra coberta? Isso, chega mais perto, me abraça. E eu adormeço de fininho.
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